“No contexto de toda a produção de pintura de Ricardo Barros, temos duas fases distintas: uma abstracta (sugestão do mar) e outra figurativa (sugestão insular), embora, episodicamente, as duas estéticas apareçam em coexistência. Para o pintor, a ilha de S. Miguel, onde vive, não é só e linearmente uma ilha rodeada de mar. É uma ideia ilha onde o seu imaginário mundo criativo se desenvolveu e evoluiu, envolvendo-o em parâmetros de aproximação à identidade insular, o que vem dar um novo sentido ao seu trabalho. Na obra de Ricardo Barros, o mar não é iconográfico e muito menos assenta em regras naturalistas. Esteticamente, podemos considerá-lo abstracto, buscando em muitos gestos. Nesta estada prolongada em S. Miguel, o pintor é, consciente ou inconscientemente, invadido por um universo surpreendente; pinta de dentro para dentro como se fora o borbulhar da lava de um vulcão. Agora, nos seus últimos trabalhos, prisioneiro dessa mesma cor da lava, representa mulheres sem gestos e homens sem rosto, seres equidistantes na esperança de encontrar um paraíso criado à semelhança do proposto para Adão e Eva, em que dois frutos (maçã ou laranja) lembram o pecado, a desculpa para a culpabilização. Nesta viagem com Ricardo Barros, não escolhi um caminho terrestre para chegar ao entendimento da sua obra, escolhi uma rota marítima, e nesta identidade oceânica, mais do que submissão temática, encontrei uma ilha sublimada.”
Em Ricardo Barros, para nos sentirmos tocados por esta singular identidade, precisamos de relacioná-la, procurá-la… a arte encontra-se, disse Picasso, e é esse encontro que procuro sugerir ao leitor, quando este olhar e interpretar o conjunto da obra do artista. Procurei inserir o imaginário de Ricardo Barros no contexto de obras de poetas, prosadores e pintores do espaço geográfico continental e insular. Visões criativas que se apresentam similares, coexistentes, mesmo sem obedecerem a objectivos e temporalidades programadas, e que permitem colocar o percurso do jovem pintor nesta sintonia artística de homens e mulheres mediterrânicos, de sol e sal, mas também afectados e afectuosos pelos elementos telúricos dos lugares vivenciados O mar de Ricardo Barros serve a expressão de Raul Brandão… e no entanto que grandeza! Uma grandeza gloriosa porque intimista, encontrada também, na poética da Sophia de Melo Andresen… procurei-me na luz, no mar, no vento. Será a partir desta obra poética, que a leitura da identidade oceânica na pintura de Ricardo Barros começará a ser partilhada, porque também, como diz o poeta Jorge de Sena sobre Sophia Andresen… os seus poemas transfiguram uma realidade concreta, em que o amor da vida […] encontra símbolos marinhos. Com esta sensibilidade poética, se entrecruza a viagem ao percurso da obra do pintor A. Cunha e Silva